sexta-feira, 18 de junho de 2010

Deuses na vitrine


Cultuo o vácuo
O vácuo de um tecido jeans inerte.
Cultuo a face estreita, a face estéril e opaca,
Um feito estatuário dos novos tempos,
Rosto replicado em muitos.

No altar de minha alma
Concebo novas crenças de uma próxima estação,
Concebo modelos como totens de uma tribo anônima,
Concebo e me inscrevo nessas adorações massivas.

No altar de minha consciência sacrifico-me um pouco mais,
E sobra um pouco menos de minha, já minúscula, ciência de mim mesmo.
Fragmento-me em estilhaços de um espelho cego, vago,
Fogo fátuo de minha antiga compleição.
Soldo-me, numa vontade imensa de fazer-me liga,
Figura exposta e atrativa,
Formada de falas externas, alienígenas.
Figura composta de imagens, de vertigens,
Vértices que me ocultam de meu ser,
Por trás de um silêncio,
De um abandono,
Saqueado de mim em meu próprio porto,
Saqueado de mim mesmo nesses estilhaços rotos,
Cascas ocas,
Frígidas vias,
Caminhos errantes que apontam um deserto imenso,
Essencial, burlesco, vivo... um cenário vítreo,
Vitral alegórico de nossos deuses midiáticos,
Viral, contagioso e irrevogável.